sábado, 9 de novembro de 2013

Furo à memória

Há dias em que acreditamos em tudo! Há cerca de uma semana vi uma imagem, uma imagem comum numa revista menos comum, mas daquelas que habitam para sempre o nosso imaginário porque, algum dia, fizeram parte do nosso quotidiano. À distância de umas décadas, ali estava ela... a máquina de furos da Regina! A mesma que tantas vezes via ao longe na prateleira de vidro do salão de jogos, cuja imagem refletida na parede forrada de espelhos sob luzes de neón, me fazia sempre parecer tão longe. Tão longe de alcançar e distante também no tempo, agora que penso nisso. Já na altura, chegava a contar os dias entre cada aparição da dita máquina, quando o meu avô me levava nas tardes de Domingo ao salão de jogos ou à sociedade recreativa para o lanche de fim-de-semana. Era sempre um momento único na companhia do avô, que me introduzia assim na "vida social". Lembro-me que sorria com as minha questões, as minhas muitas perguntas sem sentido, mas que eram permitidas a uma criança nas tardes de Outono já frias no Alentejo. Eu gostava tanto de fazer o furo no painel amarelo com pequenas circunferências brancas. "Este!Já está!", exclamava eu ao mesmo tempo que olhava para a bola que acabara de cair, na expetativa que a bola que acabara de cair trouxesse o número do maior chocolate exposto no painel de prémios. A troco de alguns escudos, vinha todo contente para casa com o chocolate que trazia, pela mão do meu avô. Olhava para cima e parecia-me um homem muito alto, que na verdade não o era (quando o passei em altura apercebi-me disso),que falava e saia-lhe fumo pela boca, do frio que se fazia sentir, do seu casaco castanho, do meu gorro às riscas vermelhas e brancas com uma borla no cimo, que ele me trouxe da Serra da Estrela, o meu capote mini mini... Recordo-o à porta de casa, as suas mãos grandes e grossas, mãos de trabalho, a segurarem levemente a barra de chocolate envolto em papel vermelho com riscas e o sabor da tablete de chocolate com recheio de fruta. Isto das memórias é uma merda. Mas ainda bem que existem e nos fazem sentir um aperto daqueles no peito, um sorriso acompanhado de brilho nos olhos... felizes por as ter. O meu avô já cá não está para ver a máquina de furos da Regina, mas tenho a certeza que se recordaria tal e qual como eu.

Sem comentários: